namorados


Sei que o dia dos namorados por aqui já passou...
foi sábado passado, mas acabou que tive um final de semana
tão busy que não escrevi nada. Mas fica ai então uma comemoração
adiantada pro dia 12 de junho, com um poster de um dos meus designers
favoritos que tem uma lojinha linda em Columbia Flower Market que se
chama RyanTown e um texto do Drummond.

Namorados

Quem não tem namorado é alguém que tirou férias remuneradas de si mesmo.
Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namoro de verdade é
muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, de saliva, lágrima, nuvem,
quindim, brisa ou filosofia.

Paquera, gabiru, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão é fácil.
Mas, namorado, mesmo, é muito difícil. Namorado não precisa ser o mais bonito,
mas aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente
treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção. A proteção dele não precisa
ser parruda, decidida ou bandoleira: basta um olhar de compreensão ou mesmo de
aflição. Quem não tem namorado, não é que não tem um amor: é quem não sabe o
gosto de namorar. Se você tem pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e
dois amantes, mesmo assim pode não ter um namorado.

Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, cinema, sessão das duas,
medo do pai, sanduíche de padaria ou drible no trabalho. Não tem namorado quem
transa sem carinho, quem se acaricia sem vontade de virar sorvete ou lagartixa
é quem ama sem alegria. Não tem namorado quem faz pacto de amor apenas com a
infelicidade. Namorar é fazer pactos com a felicidade ainda que rápida, escondida,
fugida ou impossível de durar.

Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas: de carinho escondido na
hora em que passa o filme: de flor catada no muro e entregue de repente, de poesia
de Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar, de
gargalhada quando fala junto ou descobre a meia rasgada; de ânsia enorme de viajar
junto para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico
ou foguete interplanetário.

Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, fazer cesta abraçado, fazer
compra junto. Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar
horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhados de
alegria pela lucidez do amor. Não tem namorado quem não redescobre a criança própria
e a do amado e sai com ela para parques, fliperamas, beira d'agua, show do Milton
Nascimento, bosques enluarados, ruas de sonhos e musical da Metro.

Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros,
quem não recorta artigos, quem não chateia com o fato de o seu bem ser paquerado.

Não tem namorado quem ama sem gostar; quem gosta sem curtir; quem curte sem aprofundar.

Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no
fim de semana,na madrugada ou meio-dia de sol em plena praia cheia de rivais.
Não tem namorado quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar; quem
vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir junto com ele.

Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho e em paz.

Não tem namorado quem não fala sozinho, não ri de si mesmo, e quem
tem medo de ser afetivo. Se você não tem namorado porque não descobriu
que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilos
e de medo, ponha a saia mais leve, aquela de chita, e passeie de mãos
dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras, e escove a
alma com leves fricções de esperança. De alma escovada, e coração
estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim.
Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo da janela.

Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada.
Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu
descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola
falante a dizer frases sutis e palavras de galanteira: Se você não
tem namorado é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário
a fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido.

Enlou-cresça.

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